quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Carlos Drummond de Andrade

Carlos Drummond de Andrade (Itabira do Mato Dentro [Itabira] MG, 1902 - Rio de Janeiro RJ, 1987) formou-se em Farmácia, em 1925; no mesmo ano, fundava, com Emílio Moura e outros escritores mineiros, o periódico modernista A Revista. Em 1934 mudou-se para o Rio de Janeiro, onde assumiu o cargo de chefe de gabinete de Gustavo Capanema, Ministro da Educação e Saúde, que ocuparia até 1945. Durante esse período, colaborou, como jornalista literário, para vários periódicos, principalmente o Correio da Manhã. Nos anos de 1950, passaria a dedicar-se cada vez mais integralmente à produção literária, publicando poesia, contos, crônicas, literatura infantil e traduções. Entre suas principais obras poéticas estão os livros Alguma Poesia (1930), Sentimento do Mundo (1940), A Rosa do Povo (1945), Claro Enigma (1951), Poemas (1959), Lição de Coisas (1962), Boitempo (1968), Corpo (1984), além dos póstumos Poesia Errante (1988), Poesia e Prosa (1992) e Farewell (1996). Drummond produziu uma das obras mais significativas da poesia brasileira do século XX. Forte criador de imagens, sua obra tematiza a vida e os acontecimentos do mundo a partir dos problemas pessoais, em versos que ora focalizam o indivíduo, a terra natal, a família e os amigos, ora os embates sociais, o questionamento da existência, e a própria poesia.

Sobre a Poesia e a Liberdade


Por Caroline Dias
Uma poesia tem algo que um romance jamais terá: a liberdade. Embora existam análises de grandes estudiosos, a poesia segue livre. Em um romance como Dom Casmurro, por exemplo, criam-se hipóteses que vão além do texto, como a possibilidade de Bentinho não ter sido traído, no entanto, essa hipótese é baseada em indícios deixados pelo autor. De acordo com o texto, a traição é um fato, pois só o narrador é capaz de contar este acontecimento. Ou seja, romances podem ser discutidos e interpretados, mas consistem numa só verdade, uma só história: aquela que foi narrada.
A poesia não. Ela tem uma liberdade magnífica. Isso porque os versos não são sempre objetivos e falam dos fatos através de sensações, visões, metáforas. Todas as figuras utilizadas na poesia buscam mostrar uma idéia, mas não necessariamente a explicitam.
Tendo isso em mente, encontramos no Modernismo o ápice da liberdade da poesia, pois o próprio movimento modernista exala liberdade. O poeta moderno busca velocidade. É o homem consciente do seu ser e estar no mundo, e este mundo veloz muda os contextos em uma rapidez alucinante. É neste contexto que se enquadra “A Rosa do Povo”, um livro escrito em período de dor, de guerra, há mais de setenta anos, mas cujos poemas, lidos no contexto atual, podem inspirar outros sentimentos e pensamentos não menos verdadeiros.
Eddie Vadder certa vez, quando lhe perguntaram o significado de uma de suas músicas, respondeu que não gostava de explicar suas composições, pois tirava assim dos ouvintes a parte que lhes cabia da criação, e que um compositor não escreve suas letras para si, mas sim admitindo que cada um que escutá-las irá recriá-la dentro do contexto da sua própria vida ou imaginação.
A poesia é livre, e nós somos livres para interpretá-la de acordo com nossas próprias idéias. Cada um que lê uma poesia ou ouve uma canção torna-se parte dela. Pensando nisso, escolhemos quatro poemas de “A Rosa do Povo” para analisarmos: A Flor e a Náusea, Áporo, Passagem da Noite e Carrego Comigo. Além das análises e explicações que lemos em apostilas e textos explicativos, criamos nossos próprios pensamentos sobre os poemas citados.


Carrego Comigo
Por Heloísa Miro e Frederico Milani



“Carrego comigo
há dezenas de anos
há centenas de anos
o pequeno embrulho. (...)
Não ouso entreabri-lo.
Que coisa contém,
ou se algo contém,
nunca saberei.”


(“Carrego Comigo”, Carlos Drummond de Andrade)

Lendo o poema ‘Carrego comigo’, de Carlos Drummond de Andrade podemos interpretar de diferentes formas. Levando em conta o contexto histórico da época é possível o entendimento de que o tal embrulho descrito no poema possa ser uma ideologia. Apesar da temática modernista o texto torna-se totalmente atemporal se consideramos a volubilidade das idéias.
Todas as ideologias políticas são perfeitas, em tese. No poema, o embrulho, se considerado uma ideologia política, mostra exatamente a caixa de surpresas que a mesma pode ser. Seguimos ideologias apostando no bom funcionamento delas, mas estaríamos mais seguros e aliviados se soubéssemos previamente a eficácia do método, como vemos no seguinte trecho ‘Se agora te abrisses/e te revelasses/mesmo em formas de erro,/ que alívio seria!’.
Enfim, percebemos que lutamos por algo desconhecido, que nunca vimos em prática e que depositamos todas as nossas esperanças. O medo e a repressão nos impedem de abrir o embrulho, testar o método, mas a certeza de que daria certo nos faz andar sempre com ele, sem nunca desistir de carregar conosco nossas desconhecidas convicções.
Levando em conta o lado sentimental do poeta, que certamente estava conturbado e complexo devido a situação da política brasileira podemos interpretar de uma maneira simples. O poeta diz que carrega um embrulho, o qual não ousa nem mesmo entreabri-lo. Pode ser uma metáfora para um sentimento que está guardado dentro de si. Algo que ele desconhece, mas não precisa ou simplesmente não tem vontade de saber o que é. Pode inclusive ser algo que não o incomoda por existir (se existir). O que não muda o fato de que esse “embrulho” está com ele há muito tempo e que é algo importante para ele.

Passagem da Noite
Por Paula Vasconcellos

"E que adianta uma lâmpada?
E que adianta uma voz?
É noite no meu amigo.

É noite no submarino.
É noite na roça grande.
É noite, não é morte,
é noite de sono espesso e sem praia."


("Passagem da Noite", Carlos Drummond de Andrade)

“A Terra é azul”, disse o russo Iuri Gasgarin, no dia 12 de abril de 1961; a bordo da nave Vostok 1, na qual deu uma volta completa em órbita ao redor do planeta.
Sim, a Terra fascina o ser humano. Deve ser todo o mistério que a circunda, ou suas riquezas que ajudaram na evolução do homem. De fato, cada um dos 6,5 bilhões de habitantes depende dessa grande massa. Depende para suas criações. Seus inventos, seus progressos. Depende da água, do alimento, de tudo que vem dela.
Com o planeta Terra, o homem aprendeu a criar, e evoluir, e criar diferentes civilizações. E com isso, vieram suas diferenças, e essas diferenças causaram destruições. O homem aprendendo a destruir todo seu progresso, e é triste que nós tenhamos que ser os telespectadores dessa devastação. O homem contra o homem roubando aquele magnífico cenário da Terra e de suas naturezas.
Povo contra povo. Como o ser humano pode criar, e ao mesmo tempo, arruinar suas criações? E pior, arruinar a si mesmo?
A Terra é azul. No meio de um cenário de guerra, isso não faz diferença. O povo quer paz, felicidade. Não há vencedores em uma guerra, então para quê inicia-la?



A Flor e a Náusea
Por Felipe Kobayashi e Jullyanna Salles

"Vomitar esse tédio sobre a cidade.
Quarenta anos e nenhum problema resolvido, sequer colocado.
Nenhuma carta escrita nem recebida.
Todos os homens voltam para casa.
Estão menos livres mas levam jornais e soletram o mundo, sabendo que o perdem."


("A Flor e a Náusea", Carlos Drummond de Andrade)

Neste poema identificamos uma realidade cruel, estagnada, onde já não há mais esperança para muitos, com condições de vida precárias. Nos dias atuais a situação não se difere muito, em um lugar onde ninguém tem voz, e o tédio (vomitado) é causado pela estagnação do país, o qual não evolui, e não se tem notícias boas, o ódio e a raiva crescem e a aceitação e a iniciativa ficam sem voz, pois o ódio é a única coisa que ainda movimenta a todos. A flor no concreto representa um meio de esperança ao mundo, pois ela mostra que apesar de ser frágil e feia, foi capaz de furar o concreto, ou seja, cada um tem dentro de si a capacidade para vencer seus desafios, e por mais dificuldades que se passem, não se pode desistir, pois assim que se desiste na vida, já não há mais razão para se viver. A vida não é uma questão de ter um coração batendo e um cérebro funcionando, a vida é uma questão de luta para chegar aos seus objetivos, uma vez que não temos objetivos, ficamos estagnados.
O poema "A Flor e a Náusea" é absolutamente atual, e pode ser relacionado com o seguinte texto extraido de uma série de televisão, Everwood:

“Quanto mais as coisas mudam, mais elas continuam as mesmas. Eu não tenho certeza de quem foi a primeira pessoa a dizer isso. Provavelmente Shakespeare. Ou talvez Sting. Mas no momento, é a frase que explica melhor meu defeito trágico, minha incapacidade de mudar. Eu não acho que esteja sozinha nisso. Quanto mais eu conheço as pessoas, mais eu entendo que é o defeito de todos. Ficar exatamente no mesmo lugar no maior tempo possível, perfeitamente parado... De algum jeito, parece mais seguro. E se você está sofrendo, pelo menos a dor é familiar. Porque se você tomar uma decisão e esperar que tudo dê certo, sair da sua caixa, fazer algo inesperado... Ninguém sabe que outra dor está lá fora, esperando por você. Chances de ser pior. Então você se mantém no status quo. Escolhe a estrada já percorrida e não parece tão ruim. Não tão longe quanto seus defeitos vão. Você não é viciado em drogas. Você não está matando ninguém... Talvez você esteja se matando um pouco. Quando você realmente muda, eu não acho que é como um terremoto ou uma explosão, quando de repente nós somos pessoas diferentes. Eu acho que é menor que isso. O tipo de coisa que a maioria das pessoas nem notariam a menos que elas olhassem para nós bem de perto. O que, graças a Deus, elas nunca fazem. Mas você percebe. Dentro de você essa mudança parece um mundo de diferenças. E você espera que seja.”
(Everwood – Meu Defeito Trágico, Ephram Brown)

Áporo
Por Caroline Dias

"Que fazer, exausto,
em país bloqueado,
enlace de noiteraiz e minério?"

("Áporo", Carlos Drummond de Andrade)

Nós vivemos cavando, incansavelmente, buscando por uma fresta, um momento em que conseguiremos enfim chegar à superfície. Lutamos a vida toda para estar em evidência, para exaltar a voz e dizer o que pensamos. E o mundo, a ordem e nós mesmos nos sufocamos. Hoje, somos livres, mas nos calamos, na esperança de que tudo se ajeite de alguma forma mágica. Somos muitos, e muito semelhantes. Povo passivo, oprimido pelos próprios instintos. Vivemos um dia após o outro, esperando que o grito saia da garganta, que a flor nasça. Lutamos pela nossa existência, num círculo vicioso de problemas sem solução que se criam da nossa falta de ação.
No contexto em que foi escrito, o poema pode significar a incansável busca pela paz, pelo equilíbrio entre povos e ideologias, que é tão complexo quanto o áporo (problema sem solução), mas não esconde o que vemos boa parte dos poemas do livro: a esperança. A beleza da flor que se sobrepõe ao esforço do inseto. O milagre da vida em meio à terra sufocadora. A rosa que, no fim de tudo, salva o povo.

A Rosa do Povo - Uma breve análise


Por Heloísa Miro e Augusto Antico

O livro ‘A Rosa do Povo’, de Carlos Drummond de Andrade é interpretado como uma critica disfarçada ao governo Vargas nos anos de 1943 a 1945, quando o livro teve seu fim.
Livro composto por poemas de crítica social, feita através de metáforas, carrega todas as características da segunda fase do Modernismo brasileiro. Se lermos o título da obra além das palavras podemos deduzir que a rosa do povo refere-se a poesia coletiva que Drummond fazia naquelas páginas.
Segundo vários estudiosos, A Rosa do Povo é o livro mais politizado do escritor mineiro. Em vários dos poemas que compõem a obra vemos criticas sutis a ditadura e a banalidade das obras literárias da época.
No contexto da obra, Drummond tenta achar o significado da poesia, do ato de escrever, pois achava inaceitável o conceito de arte pela arte. Mesmo com a temática engajada na política, o autor encontra meios de passar seu ponto de vista sobre a importância da literatura, e como deveria ser feita, como no poema "Consideração do poema".
O paradoxo é extremamente presente durante o livro. Em um poema vemos a esperança nítida em cada sílaba, e no próximo, a vontade de largar os objetivos. A presença da poesia metalingüística tem extrema importância no entendimento da obra.
Enfim vemos a clara esperança por esperança. Esperança de um mundo menos sujo, um lugar mais justo, mais livre, um lugar que nunca foi visto antes e que provavelmente
não seria visto.